Blog Vou de Bike

Postado em 26 de March por gugamachado

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Como foi o encontro com o Prefeito da maior cidade da América Latina

por @DanielGuth

Na ultima sexta-feira (22/03) um grupo de ciclistas foi recebido pelo Prefeito Fernando Haddad, na sede da Prefeitura paulistana.

Reunião motivada a partir da manifestação na Avenida Paulista em favor da vida e em repúdio ao atropelamento do ciclista David – que se estendeu até a porta da casa do Prefeito, no Paraíso – o encontro reuniu representantes das nossas entidades, da sociedade civil e do poder público municipal.

Relatamos, abaixo, a ATA COMPLETA do encontro, com o descritivo do que foi discutido (informações organizadas pela Associação Ciclocidade e revisadas pelos ciclistas que estiveram presentes).

Só uma observação antes da leitura: muito foi dito sobre este encontro, nas redes sociais. Apesar do descrédito agudo e justificado que temos das instituições públicas e políticas, houve um consenso entre o grupo que lá esteve reunido de que é momento de dar um “salto de fé”, acreditar nas decisões imediatas e na real possibilidade de termos uma cidade cada dia mais inclusiva ao ciclista urbano.

Independente de sabores partidários, resultados eleitorais, disputas de poder (no micro e no macro), é momento de refletirmos e estendermos nossas mãos para uma cidade melhor. Uma boa expressão para este momento, traçando um paralelo com o pós-guerra e a reconstrução da sociedade japonesa, é o ditado Kaizen “hoje melhor do que ontem, amanhã melhor do que hoje”. Um melhor que não seja o meu melhor, que pode não ser o seu melhor, mas o melhor com o foco EXCLUSIVO no interesse público. E vale reforçar, concluindo, que o interesse público muitas vezes é conflitante com o senso comum. Caberá ao chefe do executivo, portanto, saber governar com o norte no interesse público, mesmo que isto represente, por vezes, ter de contrariar o senso comum.

E vamos à ATA DA REUNIÃO:

Reunião entre ciclistas e prefeito Fernando Haddad

Dia: 22/03/2013 – Hora: 06h
Local: Prefeitura Municipal de São Paulo

Estiveram presentes:

Fernando Haddad, prefeito de São Paulo; Chico Macena, secretário de Coordenação das Subprefeituras; Ronaldo Tonobohn, superintendente de Planejamento da CET; Gustavo Vidigal, chefe de Gabinete do Prefeito; Felipe Aragonez, diretor do Instituto CicloBr; Gabriel Di Pierro e Jéssica Martineli, diretores da Ciclocidade; Raphael Monteiro, do Bike Anjo; Ricardo Corrêa, da TCUrbes; Sérgio Zolino, do Pedala São Paulo; Willian Cruz, do site Vá de Bike; Arturo Alcorta, Daniel Guth, Emerson Violin, Renata Falzoni, Renata Winkler, Roberson Miguel dos Santos e Thiago Pereira, membros da sociedade civil.

A diretora da Ciclocidade, Jéssica Martineli, iniciou a reunião apresentando o grupo presente e agradeceu ao prefeito pela oportunidade de agendar a reunião para ouvir a demanda dos ciclistas. Falou da importância do momento e que o grupo representa apenas uma pequena parte da diversidade de ciclistas da cidade. Informou que todos vêm acompanhando sua atuação em prol dos ciclistas desde o ano passado, durante o processo eleitoral, quando ocorreu a assinatura da Carta de Compromisso com a Mobilidade por Bicicletas, e, posteriormente, por meio de seu programa de governo, que apresenta propostas específicas para a área. Afirmou que o grupo ali entende que já existem diversas propostas para quem pedala, que elas contemplam parte do que os ciclistas esperam do poder público, porém, que essas ações devem ser colocadas em prática com urgência, para evitar incidentes como o ocorrido com o ciclista David Santos Sousa, fato que acabou mobilizando os ciclistas e culminou no agendamento da reunião. O grupo levantou cinco pontos que devem ser discutidos e tratados com urgência, informou.

Gabriel Di Pierro, também diretor da Ciclocidade, fez a apresentação destas considerações mais relevantes ao prefeito: 1) realização de campanhas educativas que reforcem o espaço que o ciclista pode ocupar na rua, garantido por lei, ação que aparentemente é possível de ser realizada, de maneira imediata; 2) acalmamento do tráfego e a redução de velocidade, algo que já foi anunciado pelo governo e vimos como positivo, e que também pode ser colocado em prática, inclusive, na avenida Paulista; 3) gostaríamos que as políticas fossem construídas com a participação dos ciclistas, dentro de espaços formais, como o Pró-ciclista, em audiências locais onde estão sendo executados os projetos, em espaços nas Subprefeituras e com acesso aos projetos; 4) ter um órgão que coordene as ações ligadas à bicicleta, algo previsto no plano de governo, e que pode ajudar a viabilizar as ações; 5) pensar no orçamento destinado às ações pró-bicicleta, para que a falta de recursos não atrapalhe a execução dos projetos. Di Pierro também pediu cuidado com as manifestações públicas da prefeitura, lembrando que ao desaconselhar o trânsito de bicicleta em algumas vias como a Avenida Paulista, o poder público pode contribuir para uma compreensão errônea de que bicicletas não podem circular nesses viários, gerando maior animosidade em relação aos ciclistas. Encerrou sua fala ressaltando a importância do prefeito indicar ações mais imediatas.

O prefeito Fernando Haddad iniciou sua fala contando suas impressões sobre os primeiros 90 dias do seu governo e sobre as primeiras ações realizadas pela nova gestão. O prefeito informou que os ciclistas são o segundo movimento social recebido por ele, lembrando que havia se reunido somente com movimento da moradia. Disse que a prefeitura está cuidando, em primeiro lugar, das situações que envolvem a vida das pessoas e de salvaguardar a integridade física delas. Nesse contexto, saúde, educação e a questão do trânsito/mobilidade estão sendo tratados emergencialmente. O prefeito afirmou ainda que percebe que São Paulo peca muito na questão da comunicação e da participação, que a cidade não se comunica. Haddad disse que no caso da bicicleta é preciso comunicar melhor qual é a nova realidade da cidade, pois as pessoas mais velhas ainda têm a consciência de que a bicicleta é para ser usada onde não tem carro. Disse que é preciso se readequar ao que está acontecendo no mundo, com relação à questão ambiental e à questão da mobilidade, e que será preciso reeducar as pessoas para uma outra dimensão. O prefeito reforçou que está 100% de acordo com o primeiro ponto apresentado pelos ciclistas. Sobre a participação, o prefeito afirmou que também acha essencial e por isso estão montando o Conselho da Cidade, com mais de cem pessoas, para ter um canal, para ouvir. Os conselhos estavam desidratados ou nem haviam sido constituídos e agora eles irão retornar, disse o prefeito. Segundo Haddad, a CET tem que ter um espaço de participação da sociedade civil. Sobre o orçamento, o prefeito informou que isso será discutido ao longo de sua gestão, pois recursos poderão vir de parcerias. Haddad informou então que será feito um plano de comunicação. Falou ainda que a prefeitura pode exigir das concessionárias de ônibus que sejam realizados cursos com motoristas de ônibus para sensibilização e sugeriu que sejam feitos eventos para sensibilizar os motoristas. O prefeito pediu licença da reunião para conceder uma entrevista e informou que retornaria a seguir.

Na sequência, o superintendente de Planejamento da CET, Ronaldo Tonobohn, iniciou sua fala informando que já vem conversando com alguns representantes de ciclistas sobre o que a Secretaria de Transportes e a CET pensa a respeito do sistema cicloviário de São Paulo, e que já há produção de infraestrutura cicloviária espalhada em vários órgãos da cidade (Secretarias do Verde e Meio Ambiente, Esportes, Turismo, Transportes e nas Subprefeituras). Tonobohn disse que a SMT está fazendo um esforço grande para coordenar essas diversas ações, mas que há ainda outros produtores de infraestrutura cicloviária na cidade que a Prefeitura não tem controle, como a Sabesp, Petrobrás, CPTM e Metrô. É por isso, afirmou Tonobohn, que é preciso ter muito cuidado sobre o que a Prefeitura pode admitir que seja de fato infraestrutura cicloviária, que há produção de infraestrutura que é muito importante e estruturante, mas que há casos em que se quis dar uma ocupação ao terreno, repassando a responsabilidade de manutenção. Tonobohn disse que vem insistindo em usar o termo sistema cicloviário, e não ciclovia, porque já há um entendimento de que ciclovia não é a solução, mas sim uma composição de soluções, e as soluções de compartilhamento são muito simpáticas para a gestão municipal. Segundo o superintendente, o planejamento atual da CET foca a implantação de um sistema cicloviário voltado para a demanda de regiões da periferia da cidade. Segundo Tonobohn, já existem projetos prontos para serem implantados na região do Jardim Helena, na Zona Leste; na região do Jardim Brasil, na Zona Norte; e no Grajaú, na Zona Sul – regiões onde há demanda e que precisam de estrutura. De acordo com Tonobohn, nas grandes avenidas será dado o máximo de proteção ao ciclista.

Questionado se esses projetos são os mesmos herdados da gestão anterior, Tonobohn informou que há 60 km previstos em projeto executivo pronto que serão implantados e que a prefeitura já está buscando recursos para isso, e estão sendo desenvolvidas as complementações desses três sistemas que vão se somar a mais 270km para atender uma demanda existente. Segundo Tonobohn, nas vias de tráfego mais pesado, vias estruturais e arteriais, a CET vai procurar privilegiar o tráfego segregado, pois há a preocupação de dar proteção ao ciclista. A prioridade, informou Tonobohn, é viabilizar o que tem projeto e atender uma demanda que existe de trabalhadores, de classe mais baixa, que precisa ser assistida, com a diretriz clara de integrar o sistema de bicicletas com o sistema de transporte coletivo.

De acordo com Tonobohn, foi adotada a diretriz de que toda via nova tem que ter sistema cicloviário, todas as compensações ambientais e todos os pólos geradores que têm sido avaliados precisam apresentar soluções para a bicicleta. Segundo Tonobohn, o segundo momento de desenvolvimento do plano é trabalhar em cima da mudança de modal da cidade. Segundo ele, há os projetos para atender a demanda citados, a consolidação da rede cicloviária que já existe na cidade e o próximo passo é mapear as viagens de automóveis que tenham no máximo 7km e começar a trabalhar, em cima das origens dessas viagens, a promoção da migração de modal, viabilizando condições para que os motoristas possam mudar para o modal bicicleta, consolidando a bicicleta como o segundo modal de transporte da cidade, atrás apenas dos coletivos.

O secretário de Coordenação das Subprefeituras, Chico Macena, disse que existe uma vontade política muito grande, inclusive do próprio prefeito, em favor de uma nova política de mobilidade para a cidade, mas que também existe uma resistência das estruturas, e que é preciso promover uma mudança cultural dentro da própria administração, para também promover uma mudança de paradigma da própria sociedade. O secretário acredita que há uma grande oportunidade de avançar, que antes existiam ações de guerrilha, pontuais, e agora é preciso promover mudanças estruturais para mostrar a viabilidade da bicicleta na cidade. Para isso, afirmou o secretário, há oportunidades favoráveis, como o debate do Plano Diretor, com perspectiva dos próximos seis meses. O Plano Diretor hoje, afirmou o secretário, contém diversos projetos de ciclovias que não se articulam a nada, e uma das bases que será preciso considerar para realizar a revisão dele, será o Plano Nacional de Mobilidade Urbana. O Kazuo Nakano (arquiteto e urbanista) vai coordenar o processo do Plano Diretor, disse o secretário, e está acertado que haverá uma abertura bem específica para os ciclistas, com discussões temáticas, para ajudar a promover essa mudança cultural. De acordo com o secretário, é preciso ter feitos demonstradores, com projetos estruturantes a partir dos conceitos que se defende, para poder mostrar que é viável e real.

O diretor da Ciclocidade, Gabriel Di Pierro, perguntou ao secretário se seria viável a realização de um seminário de sensibilização sobre a mobilidade por bicicletas para profissionais da Prefeitura. Chico Macena afirmou que considera possível. O secretário seguiu sua fala, informando que no início desta gestão foi cogitado colocar o tema ‘mobilidade por bicicletas’ para ser tratado em outros órgãos, mas que ele defendeu que o assunto fosse tratado na Secretaria de Transportes, pois se defendemos a bicicleta como um modal de transportes, a SMT precisa assumir essa responsabilidade.

A diretora da Ciclocidade, Jéssica Martineli, perguntou sobre a previsão de retomada do Pró-Ciclista (grupo do executivo formado por órgão municipais para fomentar o uso da bicicleta), e o superintendente Ronaldo Tonobohn, informou que o decreto que formaliza o grupo, seu formato e forma de participação, está sendo revisto, assim como outros processos e estruturas dentro da CET.

O secretário Chico Macena tomou a palavra novamente para informar que há a intenção de criar um programa de empréstimo gratuito de bicicletas na cidade, inclusive articulado ao bilhete único, mas que há uma dificuldade na modelagem e financiamento do projeto, pois a iniciativa privada não tem indicado interesse em promover ações na periferia.

De volta à reunião, o prefeito foi questionado se de fato haverá esse diálogo entre ciclistas e a Prefeitura, e o prefeito perguntou ao secretário Chico Macena qual seria a sugestão para institucionali-zá-lo. Macena reforçou que esse diálogo deve se dar via Secretaria Municipal de Transportes; lembrou da revisão do decreto do Pró-ciclista, sua composição e suas atribuições, espaço onde os projetos que estão em andamento poderão ser debatidos; e também durante a revisão do Plano Diretor, com grupos temáticos para tratar da bicicleta. Esses três pontos darão conta de discutir a política geral e os projetos para a bicicleta, destacou o secretário. O Prefeito se manifestou sobre o tema da redução de limites de velocidade além das possíveis “zonas 30”, dizendo que vai considerar, mas será necessário fazer uma avaliação sobre os locais viáveis.

Como encaminhamento da reunião, o prefeito Fernando Haddad sugeriu uma campanha de comunicação imediata, pensada estrategicamente e para ser veiculada em rádio, feita com a contribuição dos ciclistas, e perguntou quem gostaria de ser o interlocutor desse processo com a Prefeitura. Willian Cruz, Renata Falzoni e Felipe Aragonez, que trabalham com comunicação, se voluntariaram a contribuir e intermediar o processo. Após os encaminhamentos sobre a produção da campanha, o prefeito deu a reunião por encerrada.


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